Monday, February 12, 2007

É chato beber sozinho.


E aqui estou eu. Caído entre as garrafas de vermut e vinho barato na antiga mesa, da casa mais antiga ainda. E você sabe, na vitrola aquele bom e velho disco dos stones que a gente costumava ouvir.
Por isso eu estou aqui digitando coisas sem sentido na maquina de escrever, que se duvidar é mais antiga que a mesa porem menos antiga que a casa. E que casa. Um casarão.
Triste, velho e abandonado. Desde que você me abandonou, é claro.
Sempre achei ele grande pra nós dóis. Não precisavamos de quatro quartos, três salas, cozinha gigante, aréa de serviço do tamanho de uma lavanderia e um quintal capaz de abrigar muitas festas. E quantas nós não demos. Eu sei que você sempre reclamava de todos os meus amigos drogados, e os bêbados, e os malucos, e os escritores mais malucos, e os jornalistas marxistas revolucionários que se isolavam num canto discutindo o futuro e passado país, e os maconheiros espalhando a fumaça que eu sei que você odeia pela casa, e todas aquelas namoradas e acompanhantes deles que você teimava em achar que iam se jogar em cima de mim sem motivo aparente. Ah, e agora eles não estão nem perto. E muito menos você. Agora é só eu e o Joey latindo por ai. Ele tambem tem sentido a sua falta. E como.
Acho que o aluguel vai vencer. Mas eu não vou sair pra pagar. O máximo que eu tenho conseguido me deslocar é até a mercearia da esquina pra comprar os vermuts e vinhos baratos e quentes. As vezes quando sobra dinheiro algumas cervejas também.
A imobiliária fica no mínimo dez quadras de distância, e o banco a doze, e a lotérica a umas quinze. E eu não tenho forças pra abrir a porta e andar por ai.
Acho que ainda não te contei que estou sem luz também. É, eles cortaram semana passada. To tomando banho frio e bebendo vinho quente. Pelo menos a comida eu não sinto mais o gosto, mas deve estar estragada também. Não é nada parecido com aquele macarrão que você fazia. Nem com o seu feijãozinho preto. Mas até que tem me mantido firme em frente a máquina de escrever. Só ouvindo o tec, tec, tec das teclas o dia inteiro.
Fui tentar ligar pra sua mãe de novo pra ver se ela sabe por onde você anda mas cortaram o telefone também. Agora se pegar fogo na casa eu não posso ligar nem pros bombeiros.
Lembra aquele seu vinil do ABBA que eu odiava? Pois é. Me desculpa por ele. Quebrei num acesso de raiva, acho que os cacos ainda tão espalhados por aqui. Mas se você voltar eu juro que compro um novo, e paro de rodar aquele dos Ramones vinte e quatro horas por dia.
Eu to com aquela cara de presidiario que você diz que odeia. Sabe como é, não faço a barba a um bom tempo já.
Ouvi uns amigos comentando que to fedendo a bebida e em profunda decadência. Alguns tavam apostando que eu não durava um mês até cair numa clínica ou manicômio. Hahaha, idiotas. Eles devem achar que eu sou algum tipo de fracassado estúpido. E eu vou provar que estão todos errados. Eu e você meu amor.
Eu não me importo que agora você tem um buraco na cabeça. Eu realmente não me importo se teus miolos estão espalhados pelo chão de algum lugar. Pra mim você ainda é minha princesa.
Eles querem que eu te esqueça e procure outra pra viver. Mas você sabe que eu jamais vou fazer isso. Eu vou ficar aqui te esperando ouvindo o nosso disco dos Beatles e a nossa música preferida. Aposto que você lembra né? In my life.
O Joey ta bem triste ultimamente. Ele fica aqui mordendo a barra da minha calça enquanto eu escrevo provavelmente pedindo comida. Mas eu não tenho muita animação pra levantar da cadeira. Exceto pra comprar bebida. Vez ou outra jogo um pouco do meu almoço sem gosto pra ele. Parece que ele gosta, porque come bem rápido. Ao contrário daquelas raçoes ordinárias com gosto de peixe podre. As vezes também jogo um pouco de vinho ou cerveja pra ele também.
É chato beber sozinho. E você sabe como.

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