Sunday, April 29, 2007

Wait until the winter, biel...


Sempre gostei do frio. A época na infância onde assistia filmes entre cobertores junto com meus pais e minha mãe fazia chocolate quente com canela e uma barra de chocolate em cada chicara derretendo enquanto a bebida morna descia por minha garganta e aquecia meu corpo nas noites de frio. Tambem haviam os fondues. Como eram demais! Nos reuniamos em volta da mesa de vidro da sala de jantar e eu mergulhava meus pequenos pedaços de pão italiano no delicioso queijo derretido. Então vinha a melhor parte do fondue. O chocolate derretido e as frutas mergulhadas na maravilhosa massa de chocolate. Então girava e girava os pedaços de banana e uva dentro da panela constantemente aquecida por uma chama por baixo e na grande maioria das vezes acabava perdendo os pedaços de fruta la dentro. E então toda aquela batalha divertida para encontrar e caçar meu pedaço de fruta mergulhado no chocolate.
E todas aquelas roupas e mais roupas amontoadas em meu corpo. Cachecois, luvas e gorros. Era simplesmente incrivel. É claro que tambem tinha o lado ruim. Com o tempo quando passei a estudar de manhã o inverno era uma péssima epoca para se acordar. E os banhos no inverno tambem era terriveis. Mas apesar de tudo eu preferia milhoes de vezes ao calor.
E então o tempo passou e parece que levou o inverno com ele. Já fazem uns anos que não tenho os prazeres de infância e não posso adquirir novas manias para esse clima de acordo com o passar dos anos. Coisas como tomar vinho e caminhar pelas ruas de jaqueta de couro num frio de gelar o rosto, as maos e os pés. Coisas que não faço a uns dois anos ou mais.E então ontem tudo pareceu voltar a essa época antiga. Sai de jaqueta realmente precisando dela. Senti o vento gelado em meu peito coberto apenas por camiseta e fechei os botões da jaqueta jeans um pouco apertada. Mas era muito prazeroso. Não havia porque criticar. Não, nem por um minuto. O vento gelado era maravilhoso e fazia os cabelos se desmancharem no ar. Voltei para casa e dormi com dois cobertores. Há muito tempo não dormia nem com um.
E hoje pela manhã parecia que finalmente a melhor época do ano havia voltado pra ficar. Mesmo ainda sendo outono, ou primavera. Eu sei lá.
E mesmo o inverno ainda não ter chego em definitivo esse dia de frio me fez ter a sensação de que mesmo com o aquecimento global, derretimentos de geleira, recordes de temperaturas elevadas e todos esses fenômenos catastróficos que estamos passando o inverno desse ano vai ser assim como os da minha infância, ou até melhores. Filmes, cobertores, jaquetas, gorros, luvas, chocolates quente, fondue e agora mais do que nunca os vinhos baratos aquecendo minha vida.
Ah, o inverno! Espere até o inverno, biel...

A vida como ela é.



Não sei se foi a ressaca ou os quinze dias sem sair em Londrina, mas me senti extremamente apático nesta noite. Não sei se pelo fato de ser domingo talvez. O dia mais chato da semana. Um domingo enjoado e com uma dor de cabeça pra ninguém botar defeito.
Quatorze dias sem beber e uma festa de meu pai a seus amigos com 50 litros de chopp. Perdi a conta de quantos tomei. Mas sei exatamente a conta do mal estar dominical.
De qualquer modo vou contar o que aconteceu. Fui convidado a comer um lanche na lanchonete onde o pessoal costuma ir aos domingos. Não estava com fome mas queria ver pessoas e respirar um pouco de ar. Livrar-me da atmosfera caseira por um tempo. Meu espírito outsider implorava por isso. Dito e feito.
Tomei uma coca-cola e joguei papo fora. E se querem saber me arrependo de ter pisado fora de casa. Desde esse momento eu me arrependo friamente. Duas semanas depois e as coisas continuam exatamente iguais. Ou piores. Pessoas medíocres e algumas raras exceções. Todos me parecem frios. Esta tudo cinza e todos agem como marionetes construindo relações de amor e ódio. Às vezes o problema não esteja com eles. As vezes esse é o modo certo de se viver e eu estou errado, querendo que tudo seja feito com mais paixão e que as pessoas sejam mais honestas e verdadeiras. Eu realmente devo estar errado sobre tudo na vida.
Depois que todos foram embora e fiquei sozinho senti um gosto amargo em minha boca. Amargo de decepção. Não há graça em viver nesta cidade. Não há euforia nas pessoas e não há alegria nos lugares. É tudo realmente escroto. As pessoas olham para seu próprio umbigo, apontam os outros com seus dedos e falam da vida alheia com suas bocas.
Isto tudo, isto tudo sem contar o grande enjôo que se formava em meu estomago e se refletia em minha alma. A ressaca voltava à tona com a força de um foguete em disparada e a sensação de derrotismo me apunhalava em cheio como um soco na barriga. O céu sabe que sou miserável agora.
Às vezes é realmente difícil viver a vida como ela é.

A primeira aula de gaita.



Acordei tarde para variar. Quase duas. Tomei o café da manhã. È, café da manhã as duas da tarde mesmo. Passei um tempo em frente ao diário computador, tomei um banho e almocei.Esperei para pegar o ônibus e consegui uma carona. Com minha mãe mesmo. Seguimos o caminho e passamos em dois bancos antes onde tive que fazer hora até que ela me deixasse no centro. Passei na biblioteca pública. Entreguei o incrivel "bonequinha de luxo" do Capote que havia lido e tomei emprestado "Sonhos de bunker hill" do maravilhoso gênio Fante.
Segui até a casa do avô do Rico. Nos encontramos. Andamos até o shopping popular da cidade, mais conhecido como câmelo. Comprei cds virgens e um fone de ouvido barato. Fomos até um brechó e comprei um colete social novo. Novo para mim e velho para alguem. Essa é a maravilha dos brechós. Andamos de volta e fizemos o tempo passar na casa de seu avô.
Caminhei até a escola de música onde faria minha primeira aula de gaita. Aula experimental. No caminho passei na frente de um prédio onde morava uma garota que a uns três ou quatro anos atrás havia me rejeitado. Os fantasmas dessa cidade me assombram com essas lembranças.Esperei um tempo na apertada secretária da escola de música onde havia uma pequena televisão para assistir. Passava um dos progamas da tarde onde três rapazes tentavam conquistar uma garota. Os famosos progamas de namoro ou amizade eternizados pelo eterno Silvio Santos.
O professor chegou. usava sandalias de couro e roupas informais. Tinha barba e cabelo enrolados e relativamente grandes. Um rosto um pouco longo e parecia ser um bom homem.
A aula durou pouco mais de meia hora. Aprendi algumas coisas básicas sobre como segurar e assoprar a gaita e ele explicou como funcionava o curso. Então fiz minha matricula e agendei as aulas para as semanas seguintes, todas ao mesmo horário.Uma hora de ócio a menos na minha semana.
Ótimo progresso.

Thursday, April 05, 2007

Garotos e Garotas



Aquele era o bar da galera. O bar dos jovens. O bar onde garotos e garotas se encontravam para paquerar e dançar rock and roll. O bar onde os garotos jogavam sinuca e as garotas pinball. Até que um dia os garotos e garotas deram de portas fechadas. O bar havia fechado por ordem dos vizinhos e dos pais dos garotos e garotas que frequentavam o local. Agora os garotos e garotas teriam que se virar para se divertir tanto quanto ali. E os garotos e garotas cresceram. Sem nunca mais se divertir tanto quanto naquele lugar. E viraram homens e mulheres. Homens e mulheres de negócios. Homens e mulheres com relacionamentos instaveis mas empregos agradaveis. Homens e mulheres que se divertem em jantares de luxo, boates com comandas e carros do ano. Homens e mulheres que viajam para o exterior e passam os feriados no apartamento na beira da praia mais badalada. E agora os homens e mulheres tiveram filhos. E seus filhos cresceram assistindo Tv a cabo e jogando video-games de ultima geração. E seus filhos cresceram mais e gostam de ir aos bares. E seus filhos descobriram um novo bar na cidade. Um bar onde os garotos e garotas se encontram para paquerar e dançar rock and roll. Um bar onde os garotos jogam sinuca e as garotas pinball. Até que um dia os garotos e garotas deram de portas fechadas. O bar havia fechado por ordem dos vizinhos e dos pais dos garotos e garotas que frequentavam o local. Os mesmos homens e mulheres que um dia já foram garotos e garotas. Agora os garotos e garotas teriam que se virar para se divertir tanto quanto ali. E os garotos e garotas cresceram. Sem nunca mais se divertir tanto quanto naquele lugar.
E viraram homens e mulheres...

Wednesday, April 04, 2007

A madame e o motorista.



Ela era loira natural. Seios turbinados de silicone, nariz de cirurgia plástica e roupas da última moda. Gastava cinquenta reais para aparar as pontas do cabelo e desfilava pelo shopping três vezes por semana entrando de mãos vazias e saindo com dezenas de sacolas. Todas elas carregadas por um motorista contratado de quépe e terno completo. Ela tinha até nome de gente importante. Valquiria Nascimento de Mello. Chiquérrima.
Ele por outro lado tinha um nome igual a tantos outros brasileiros. Era José Carlos Da Silva. Zé Silva no trabalho por causa de outros Zé que tinham por lá e Zeca para os amigos de futebol e churrascos. Era manobrista do melhor shopping da cidade. Onde vendiam as roupas mais caras e as senhoras e senhores mais importantes passavam para renovar seu guarda-roupa.
As roupas de Zeca eram as mesmas a anos. Vez ou outra ganhava uma camisa ou meias da liquidação da loja popular no natal. Presente da vovó.
Pelo menos o emprego conseguira. Não era lá grandes coisas mas era o que Zéca sabia fazer. Dirigia muito bem e sempre fora o melhor no volante desde os amigos de adolescência.
Passava o dia girando volantes e pisando em freios e aceleradores de carros de maior luxo. Conhecia praticamente todos os carros importantes da cidade. Havia dirigido cada um ao menos uma vez. Mesmo que fosse por apenas alguns metros fazendo curvas e balizas.
Um dia o destino pregou uma peça. O motorista de dona Valquiria havia sido demitido por ela mesma. Segundo ela incompetencia. Chegara minutos atrasada no chá com as amigas na delicatéssen mais famosa da cidade. O trânsito estava feio e a hora do rush começava a dar seus sinais caóticos na grande cidade. Mas ela pouco se importou. Marcou seu chá as cinco e queria ser pontual como as ladyes inglesas deviam ser. Por isso decidiu ela mesmo dirigir ao shopping. Lá pagaria algum funcionário ou vendedor para levar as sacolas. E foi.
Chegou apressada. Largou o Porsche ganhado de presente pelo marido executivo que passava a maioria dos dias viajando na frente do estacionamento e jogou as chaves para Zéca. Não costumava gostar de ninguem. Nem mesmo gostava de seu marido e não se importava se ele tivesse amantes em suas constantes viajens. Ele financiava seus luxos e isso era o suficiente para ela. Mas simpatizou com Zeca de sopetão. Chamou o gerente do estacionamento do shopping e disse que queria o rapaz para ajuda-la a carregar as compras. Ele concordou e aconselhou o funcionário a manter o bico calado e ajudar no que fosse preciso.
Zeca acompanhou a dona por dentro do shopping. Trabalhava no mesmo lugar a mais de dois anos mas entrara no shopping no máximo três vezes. Os vendedores não gostavam de funcionários externos zanzando pelo shopping. Tinham uma imagem a zelar, diziam.
Zeca acompanhou a dona em todas as lojas. Não abria o bico em momento algum. Ela experimentava as roupas e perguntava sua opinião. Dizia que a senhora estava muito mágnifica e encolhia os ombros com vergonha. Horas de compra se passaram. A dona foi até a praça de alimentação tomar um cappucino e comer um croissant. Zeca associou aquele lanchinho de dona Valquiria com seu pão com mortadela e seu pingado todas as manhãs no bar da esquina de sua casa. Ela perguntou se Zeca estava com fome. Ele confirmou vergonhoso. Ela pediu o mesmo para o rapaz. Se deliciou na comida. Era muito melhor que pão com mortadela e pingado.
Sairam do shopping e foram ao carro. Zeca se atrapalhava em meio a tantas sacolas mas se saia bem. Dona Valquiria caminhava com seu salto alto elegante a sua frente. Descarregou as compras no banco de trás do carro. Valquiria indagou quanto o jovem rapaz recebia. Receoso Zeca falou tímido - Quatrocentos senhora. Disse que agora ele poderia ser seu chofer pelo dobro do salário. Aceitou e pediu as contas ao antigo chefe.
Ganhou quépe e terno. Agora era "elegante" também. Mesmo sem trabalhar no estacionamento continuava indo ao shopping toda semana. Os ex-colegas de trabalho agora comentavam que Zé Silva era protegido da Dona. Zeca se sentia importante. Era um bom motorista para a dona.
Um dia ao sair do shopping após mais uma tarde de compras incessantes ela indicou caminhos diferentes ao da mansão no bairro nobre onde moravam. Zeca seguiu obedientemente. Pararam em frente a um motel. Um dos mais populares da cidade. Zeca perguntou se não se tratava um engano da dona. Ela mandou seguir.
Entraram num dos quartos de paredes imundas e chuveiro elétrico no banheiro. Valquiria satisfez seus desejos de ser possuída como uma qualquer, por seu motorista. Numa cama velha com lençóis sujos.
Desse dia em diante repetiram o caminho todas as semanas.